terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Estatuto da Criança sob ameaça


Em 30 de novembro último, o Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade, ajuizada pelo PTB, referente ao artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê punição às emissoras de radiodifusão que não observarem a classificação indicativa criada pelo Ministério da Justiça, em cumprimento à Constituição Federal.

O relator da ADIN, ministro Dias Toffoli, julgou a punição inconstitucional por ferir a liberdade de expressão. Outro argumento que usou foi o de que a proteção de crianças e adolescentes de programas de TV impróprios a sua idade e processo de formação é de responsabilidade dos pais e não do Estado. É lamentável que o ministro pense assim; certamente desconhece a realidade da maioria das famílias brasileiras em que pai e mãe trabalham fora e não têm como contratar alguém para cuidar dos filhos enquanto estão ausentes. Os ministros Ayres Brito, Luiz Fux e Carmen Lúcia apoiam o parecer do relator e o ministro Joaquim Barbosa pediu vistas, o que levou à suspensão do julgamento da ação. Quem sabe, com mais tempo para estudar a matéria, os ministros avaliem as consequências da decisão que poderá afrontar o direito de crianças e adolescentes a comunicação de qualidade que respeite o seu pleno desenvolvimento. É claro que o objetivo de quem apresentou a ação é defender interesses comerciais dos concessionários de rádio e televisão, obcecados por obter mais lucros com a venda de espaços publicitários. Assim, rejeitam toda e qualquer medida que prejudique seus negócios, alegando sempre que defendem a liberdade de expressão. Seria mais honesto se dissessem que o que defendem mesmo é a liberdade absoluta de suas empresas de comunicação. Convém lembrar que são concessionários de um serviço público outorgado pelo Estado em nome da sociedade a que pertencem as frequências eletromagnéticas, através das quais se transmitem sons e imagens; conhecimentos e informações; conceitos e valores; educação e cultura, ou seja, tudo o que é parte essencial do patrimônio histórico e sociocultural da nação brasileira. Portanto, é dever do Estado zelar pelo uso justo e democrático desse bem público que deve servir ao interesse de todos. Ademais, o ECA é uma valiosa conquista da sociedade brasileira e foi inspirado na Constituição de 1988 que trata a questão da criança e do adolescente como "prioridade absoluta" e sua proteção como "dever da família, da sociedade e do Estado". Porém, a lei, por si só, não assegura os direitos fundamentais das crianças e adolescentes. É necessário ainda que os meios para sua aplicação sejam garantidos por quem tem o dever de fazê-lo, o Estado. Portanto, é inaceitável, que o Judiciário, um dos Poderes do Estado, acolha Ação de Inconstitucionalidade que elimina punição a empresas que descumprirem a classificação indicativa, em prejuízo do direito de crianças e adolescentes. Diante da ameaça de retrocesso que recai sobre o ECA, apelamos ao STF que preserve conquista inestimável da sociedade brasileira que tem nessa lei a garantia institucional da proteção integral à criança e ao adolescente em nosso país.

Deputada Luiza Erundina (PSB/SP) Publicado em 13/12

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Câmara lança Subcomissão de Acompanhamento da Comissão da Verdade

Audiência da CDHM em que foi criada a Subcomissão de Acompanhamento da Comissão da Verdade
 
Será lançada num ato público na próxima terça-feira, dia 13 de dezembro, a Subcomissão de Acompanhamento da Comissão da Verdade, criada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados para contribuir e fiscalizar os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade. O evento tem início previsto para as 14h no plenário 9 do Anexo II da Câmara.

Depois de anos de reivindicação e debates, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi instituída no âmbito da Casa Civil da Presidência da República pela Lei nº 12.528, de 18 de novembro de 2011, “com a finalidade de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos” ocorridas entre 1946 e 1988. A CNV terá sete membros, auxiliados por 14 servidores, e deverá apresentar em dois anos relatório com recomendações e conclusões dos fatos analisados.

A Subcomissão da Câmara exercerá função legislativa de fiscalização da CNV, contribuindo com a mesma com base na experiência acumulada pela Comissão de Direitos Humanos, agregando subsídios já disponíveis e outros que vier a recolher que possam contribuir no resgate da memória sobre fatos ocultados ou com versões forjadas por agentes públicos em atos de exceção.

Eleita por aclamação coordenadora da Subcomissão, a Deputada Luíza Erundina (PSB-SP), explica que “o foco será nos casos de perseguição, sequestro, tortura, assassinato e ocultação de cadáveres de opositores políticos da ditadura entre 1964 e 1985. É nesse período que se concentram os fatos a esclarecer, como, por exemplo, o papel do governo brasileiro na Operação Condor – articulação entre governos do Cone Sul e os Estados Unidos para perseguir e eliminar militantes políticos de esquerda dos países envolvidos”.

 A presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, Deputada Manuela d’Ávila (PC do B-RS) afirma que “nossa intenção ao criar este fórum parlamentar, não é concorrer com a Comissão da Verdade, mas contribuir para que ela cumpra plenamente suas finalidades. Até porque são limitados os recursos e o tempo previsto para a apresentação das suas conclusões”.

A Subcomissão criada pela CDHM terá atribuições de organizar e encaminhar à CNV informações, dados e documentos pertinentes acumulados no decorrer de seus 17 anos de atividades; pesquisar, avaliar e encaminhar à CNV informações, dados e documentos sobre eventuais casos de violações de direitos humanos de parlamentares e servidores da Câmara dos Deputados no período em análise; receber, organizar e encaminhar informações, dados, documentos e sugestões que possam subsidiar a CNV no esclarecimento de fatos objeto de sua competência; realizar seminários e audiências públicas, no âmbito da Câmara e nos estados da Federação, com o objetivo de ajudar na elucidação de denúncias e fatos pertinentes; atuar na sensibilização da Câmara dos Deputados e da opinião pública para a importância do estabelecimento da verdade factual sobre o período histórico em análise.

A Subcomissão foi instituída em decorrência da aprovação, pela unanimidade do plenário da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), em reunião ordinária de 30/11/2011, do Requerimento nº 150/2011, de autoria da Deputada Luíza Erundina (PSB-SP).

A Subcomissão também atende ao objeto estabelecido no Requerimento nº 90/2011, de autoria da Deputada Manuela d’Ávila (PC do B-RS), aprovado pela CDHM, de apuração dos casos de violações de direitos humanos com motivação política contra parlamentares e servidores da Câmara dos Deputados entre abril de 1964 e outubro de 1988.

Convidado argentino

O deputado argentino Juan Cabandié participará do ato público como convidado especial. O parlamentar tinha 25 anos quando descobriu que era filho de desaparecidos políticos, com a ajuda da entidade Avós da Praça de Maio, que intermediou um teste de DNA. Sua mãe biológica, Alicia Alfonsín, fora sequestrada por militares aos 17 anos, quando estava grávida. O bebê nasceu na Escola Militar da Marinha, principal centro de torturas da Argentina nos anos de chumbo. Sua mãe nunca mais foi encontrada. Juan foi criado pelo sequestrador de sua mãe. Após se tornar deputado distrital, Cabandié processou seu “pai”, o militar Luís Falco, que acabou sendo condenado a 18 anos de prisão.


Brasília, 09 de dezembro de 2011

Comissão de Direitos Humanos e Minorias

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Série #fotoshistóricasluizaerundina


Foto histórica de Luiza Erundina durante caminhada na campanha para prefeitura da cidade de São Paulo. Foto: Espalha Fatos

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Comissão da Verdade


Artigo publicado no AE Broadcast [Grupo Estado] em 02/12

Em ato solene, no dia 18 último, no Palácio do Planalto, em Brasília (DF), a presidente da República, Dilma Roussef, sancionou a lei que cria a Comissão Nacional da Verdade aprovada pelo Congresso Nacional, nos termos em que queria o governo e fora acordado com as Forças Armadas que continuam a monitorar os Poderes da República.
Mesmo limitada em suas pretensões, a criação da Comissão da Verdade deixou os comandantes militares contrariados, como transpareceu durante solenidade de sanção da lei, quando, para não constrangê-los, negaram a palavra a uma representante dos familiares presentes.

A lei aprovada também desagradou aos familiares das vítimas da ditadura e organizações de direitos humanos que tiveram suas propostas de alteração do projeto rejeitadas durante sua discussão, votação e aprovação na Câmara dos Deputados e confirmada, na íntegra, pelo Senado Federal. Reivindicavam a modificação de pontos que, avaliam, poderão comprometer os resultados esperados de uma autêntica Comissão da Verdade. Destacam: o longo período a ser investigado (1946-1985); dois anos apenas de duração; com somente sete membros; de exclusiva escolha da Presidente da República, e poderá ter a participação de militar; e sem autonomia financeira.

Criticam, sobretudo, o fato da Comissão não ter o poder de levar à justiça os que cometeram crimes de lesa humanidade, em razão de que a Lei da Anistia de 1979, ratificada em 2010 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), beneficia e protege os que, em nome do Estado, torturaram, assassinaram e desapareceram com opositores do regime.

Coincidentemente, no mesmo dia em que a Lei foi aprovada, no Senado Federal, a Justiça na Argentina condenou 18 militares (alguns de alta patente) por crimes de graves violações aos direitos humanos cometidos durante a ditadura militar naquele país. Também na mesma data o parlamento do Uruguai aprovou uma lei que torna imprescritíveis os crimes contra a humanidade praticados nos anos do regime ditatorial no país. Esses fatos demonstraram que o Brasil, em termos de direitos humanos, anda na contramão da história.  

Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (OEA), ao julgar o caso da guerrilha do Araguaia, decidiu pela “incompatibilidade das anistias, relativas a graves violações de direitos humanos, com o direito internacional”, ou seja, a Lei brasileira da Anistia, de 1979, afetou o dever do Estado de investigar e punir os responsáveis por esses crimes. 

Face a essa decisão, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2001, que definisse se o Brasil deve ou não cumprir a decisão da Corte quanto à Lei da Anistia e questionava se a lei de fato anistia agentes do Estado que cometeram crimes de lesa humanidade durante o regime militar. O STF decidiu manter a interpretação atual da Lei 6.683 e impedir que os responsáveis por esses crimes sejam processados, julgados e punidos.

O relator do processo deu parecer contrário à revisão da lei de Anistia, alegando que a mesma teria sido “amplamente negociada”. Convém lembrar, no entanto, as condições em que tal acordo se deu. Os militares, embora politicamente derrotados, mantinham o controle do poder e a sociedade civil dava os primeiros passos na redemocratização do país.

Como deputada federal e entendendo a premência da revisão da Lei da Anistia para que os responsáveis pelos crimes da ditadura militar não fiquem impunes, apresentei Projeto de Lei que dá interpretação autêntica ao que dispõe a Lei 6.683/1979. O mesmo foi rejeitado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, cumprindo ordens expressas do Planalto, e aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania onde, certamente, funcionará o rolo compressor do governo para que também ali seja rejeitado.

Após longa e penosa espera dos que lutam para que a verdade histórica sobre os crimes da ditadura no Brasil seja revelada e os responsáveis punidos, como outros países o fizeram, é frustrante o que se conseguiu até agora e, pior, não se tem grande expectativa quanto aos resultados da Comissão da Verdade a ser instalada, pois, mesmo se vier a identificar os criminosos, não terá como puni-los por já estarem anistiados, a menos que se aprove o projeto de lei que dá nova interpretação à Lei da Anistia. 

Chegou, enfim, a hora do Brasil passar a limpo o seu passado recente; corrigir os rumos da sua história e fazer justiça aos que pagaram com exílio, tortura, morte e desaparecimentos forçados a democracia que temos hoje.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

A ex-prefeita Luiza Erundina critica a força do lobby e da especulação imobiliária sobre o planejamento urbano de São Paulo

*Publicado no jornal terra - José Cruz/Agência Brasil - 2 de dezembro de 2011


     Foto: Claudio Leal

Ex-prefeita de São Paulo (1989-1993), a deputada federal Luíza Erundina (PSB) defende uma consulta popular para discutir o projeto do prefeito Gilberto Kassab (PSD) - aprovado em primeira votação na Câmara Municipal - que libera a construção de novos prédios na região da avenida Faria Lima.

Se o projeto for aprovado em segunda votação, a prefeitura poderá negociar mais Cepacs (títulos públicos municipais) com o setor imobiliário - uma forma de angariar recursos, ainda que isso signifique a construção de prédios que contrariem o Plano Diretor e perfil definido para a região. A Faria Lima é uma área de engarrafamentos críticos em São Paulo, e o nó pode ser agravado ainda mais com o aumento do fluxo humano e de veículos.

Erundina critica a prevalência do "lobby" e da "especulação imobiliária" acima dos interesses públicos.

- É grave, porque gera consequências irreversíveis. Por exemplo, mudar a capacidade construtiva de uma região que combina várias funções - de negócios, de serviços... Uma cidade é um ente vivo - observa a deputada. - Se nós tívéssemos uma prática, como se tem em outros países, essa é uma situação típica de um referendo ou de um plebiscito... Mas a gente não consulta nem a Câmara Municipal direito, porque os lobbies que se exercem nesses espaços institucionais de poder não me parecem muito democráticos.

A ex-prefeita também lamenta a ideia de construir o shopping "Cidade Jardim Shops Jardins", na rua Haddock Lobo, sem uma discussão prévia com os moradores da região, uma das mais valorizadas de São Paulo.

- ...Se fossem construções para habitação, prédios para moradia ou mesmo para lojas, negócios, escritórios... Mas, shopping? É muito forte a densidade de trânsito, de tráfego. Impacta profundamente a dinâmica da região. Por que fazem nessa região? É pelo valor do metro quadrado. Quer dizer, é especulação imobiliária isso aí... Uma decisão dessa, pelo impacto que vai gerar, teria que haver uma consulta.

Confira a entrevista.

Terra Magazine - A Câmara de São Paulo aprovou um projeto do prefeito Gilberto Kassab que autoriza a construção de mais prédios na região da avenida Faria Lima. É um projeto que tem sofrido críticas. Como a senhora avalia a construção de novos prédios em áreas que já são, digamos, conflagradas e congestionadas?

Luíza Erundina- Uma cidade como São Paulo precisa ter um plano diretor e um plano de desenvolvimento urbano estratégico, de médio e longo prazos, para que as intervenções urbanas - no caso, essa da Faria Lima - não desequilibrem mais ainda a organização da mobilidade urbana e a concentração do tráfego. Isso agrava a qualidade de vida da cidade. Nós introduzimos esse mecanismo na gestão da cidade, para as regiões centrais com infraestrutura de saneamento e espaço ocioso, capacidade construtiva ociosa. Além de dar pleno aproveitamento a toda infraestrutura ociosa, era em termos de quantos habitantes ocupavam esses espaços e usufruíam dessa infraestrutura. Isso, de um lado. De outro, gerava receitas e recursos públicos destinados à habilitação popular. Era articulado, vinculado, acordado em termos de um valor correspondente à valorização do metro quadrado nessas áreas - quanto mais valorizadas, mais a operação representava recursos públicos para investir em habitação popular, onde há déficit habitacional.

Não era para você capitalizar as finanças do município, capitalizar os cofres municipais, como me parece que ocorreu com as outras operações urbanas. Os recursos gerados não foram aplicados, segundo informações da própria imprensa. Mais de R$ 600 milhões teriam sido obtidos com as outras operações urbanas na cidade. E isso não teria tido aplicação numa finalidade social, do ponto de vista urbanístico, do equilíbrio da cidade, do gerenciamento da mobilidade e outras funções urbanas. As intervenções pontuais, em geral, tornam mais grave o quadro de desequilíbrio, geram problemas e agravam a qualidade de vida numa determinada região da cidade. A piora do trânsito numa região vai ter um impacto na cidade como um todo. É uma cidade que tem uma conurbação intensa, uma concentração urbana enorme, uma densidade urbana excepcional. Nesse sentido, acho que não é bom para cidade e vai na contramão da tendência das grandes cidades do mundo, que é exatamente tirar a densidade...

E reaproveitar o Centro?

Exatamente. Então, acho que não é uma política boa para a cidade, que já enfrenta grandes problemas.

Tem outra questão que a senhora sempre levantou, a respeito do planejamento da Região Metropolitana, e não apenas da cidade em suas fronteiras. Esse tipo de discussão não faz falta neste momento, perto da eleição?

Isso só é possível com um planejamento estratégico, com uma concepção de desenvolvimento urbano que abranja algumas décadas, evidentemente com planos de curto e médio prazos também, para que as coisas aconteçam de forma lógica e ordenada, para que não se agrave mais os problemas. As funções urbanas, hoje, não começam e se fecham nos limites de uma cidade na sua concepção formal. As fronteiras de uma cidade como São Paulo, em relação às cidades da grande São Paulo e da região metropolitana, não recomendam intervenções pontuais sem levar em conta os impactos que isso gera em outros espaços urbanos. Ou mesmo na própria região da cidade. Pelo crescimento acelerado e por falta de um planejamento urbano - cada governo que entra adota uma política -, isso vai se agravando. O trânsito de São Paulo está, praticamente, inviabilizando a vida da cidade.

Certas intervenções urbanas, certas licenças que são concedidas, não lhe angustiam? Agora mesmo vai ser construído um "Cidade Jardim Shops Jardins", na rua Haddock Lobo. É mais uma intervenção que vai tirar as pessoas das ruas e levá-las a um convívio fechado, de alta segurança, ao estilo do Cidade Jardim. Esse tipo de empreendimento preocupa a senhora, do ponto de vista urbanístico?

Com certeza. Porque isso impacta muito em relação à mobilidade. Um shopping, com uma movimentação muito grande, concentra. Diferentemente se fossem construções para habitação, prédios para moradia ou mesmo para lojas, negócios, escritórios... Mas, shopping? É muito forte a densidade de trânsito, de tráfego. Impacta profundamente a dinâmica da região. Por que fazem nessa região? É pelo valor do metro quadrado. Quer dizer, é especulação imobiliária isso aí. Por que conseguem que a Câmara aprove? Uma decisão dessa, pelo impacto que vai gerar, teria que haver uma consulta. Não é a Câmara Municipal sozinha que deve decidir uma operação dessa.

A senhora defende uma consulta popular?

Claro! Uma consulta pública. Um debate com a região, com a sociedade no espaço que vai sofrer esse impacto. Se fosse uma gestão democrática, uma decisão dessa não passaria apenas pela Câmara Municipal. Ou, quando viesse a ser definida pela Câmara, já teria passado pelo crivo de setores organizados da sociedade. Aí, sim, você submeteria a fase final para institucionalizar uma medida através de uma lei. E não começar pela lei, sem nenhuma discussão! Senão, a lei é gerada e sua aplicação vai gerar problemas. Uma gestão democrática tem todas as vantagens. Eles alegam que isso é mais demorado, tem que administrar conflitos, administrar interesses, mas, paciência!, democracia é isso.

Mas, em São Paulo, a especulação imobiliária é visivelmente influente no poder político.

Ah, sempre foi. Em outros momentos, a cidadania estava mais presente. A sociedade civil organizada era mais atuante, militante, interferia mais, reivindicava mais, questionava mais...

Por que mudou?

Exatamente porque são governos que não estimulam a organização da sociedade, não auscultam os representantes da sociedade, centralizam de forma autoritária o poder. Essa é um pouco a regra, não é só essa cidade, esse governo aí. Lamentavelmente, é um pouco a regra dos governos dessa cidade e do País também. É pouca democracia que se tem, no sentido de consultar a sociedade, de debater com audiências públicas, como a própria Constituição Federal e as Leis Orgânicas preveem, sobretudo quando é uma medida que vai impactar a vida de pessoas, a economia local. Não é só juntar dinheiro para fazer não-sei-o-quê. Nem se sabe precisamente onde vai ser investido esse recurso, se o custo-benefício é favorável ou não ao interesse social, ao interesse da cidade. Há muitas variáveis que devem ser consideradas quando se trata de tomar uma medida dessa natureza. É muito simplista dizer: "nós vamos liberar o potencial construtivo, permitir além dos limites da lei orgânica do município ou do código de obras da cidade"... Interfere em várias normas legais da cidade. Você tem que levar em conta tudo isso. Não se pode levar dessa forma. Hoje nós temos métodos de planejamento estratégico, temos técnicos que são capazes de fazer previsões. A discussão possibilitaria o custo-benefício. Que benefício apresenta? É simplesmente juntar algum dinheiro? Pra investir onde? Pra atingir quantas pessoas? Qual é o interesse público em relação a esse investimento? Angariar esses recursos para ficar congelado ou para especular no sistema financeiro não é bom para a cidade.

Esses improvisos têm efeitos graves imediatos?

É grave, porque gera consequências irreversíveis. Por exemplo, mudar a capacidade construtiva de uma região que combina várias funções - de negócios, de serviços... Uma cidade é um ente vivo. Ela se compõe de várias funções. Se certas funções têm uma harmonia entre elas, produzem uma cidade humanamente melhor, viável socialmente... Esses critérios, lamentavelmente, não estão presentes quando se toma uma decisão dessa forma, sem uma compreensão da cidade ou da parte da cidade que vai sofrer com essa medida. Se nós tívéssemos uma prática, como se tem em outros países, essa é uma situação típica de um referendo ou de um plebiscito. Em vários países da Europa, a cada eleição que ocorre, os eleitores são consultados não apenas sobre a eleição das pessoas, mas sobre as questões que estão na ordem do dia naquele País. Por que a gente não começa a ir testando, para criar uma cultura? Isso vai sendo incorporado pela cidadania. Mas a gente não consulta nem a Câmara Municipal direito, porque os lobbies que se exercem nesses espaços institucionais de poder não me parecem muito democráticos. Os lobbies e os interesses nem sempre confessados. A gente lamenta. Estamos às vésperas de uma eleição municipal. Não seria o momento de pensar nessas questões? Quem vai ser eleito é que vai administrar as consequência dessa política.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Erundina é eleita presidente de grupo que vai acompanhar Comissão da Verdade

Luiza Erundina: subcomissão poderá analisar denúncias sobre a Operação Condor

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP) foi eleita, nesta quarta-feira (30), presidente da subcomissão da Câmara que vai acompanhar os trabalhos da Comissão da Verdade, criada pelo Executivo para apurar violações aos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar. A subcomissão é ligada à Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

Sem caráter punitivo, a Comissão da Verdade será formada por sete pessoas, escolhidas pela presidente da República a partir de critérios como conduta ética e atuação em defesa dos direitos humanos. O grupo terá dois anos para colher depoimentos em todo o País e analisar documentos que ajudem a esclarecer as violações de direitos.

Erundina afirma que a subcomissão vai fiscalizar os trabalhos do grupo, mas também poderá contribuir com informações, "trazendo o debate para a Câmara, com familiares e especialistas, com quem detém informações históricas daquele período”.

A deputada afirma que a subcomissão terá uma agenda própria e poderá analisar, por exemplo, denúncias sobre a Operação Condor, uma aliança política entre as ditaduras militares da América do Sul, estabelecida em 1975 entre Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai. A operação foi criada para eliminar os opositores dos regimes autoritários.

"Agora estão aparecendo muitas informações e muitas denúncias a respeito da participação do Brasil. Essas coisas têm que vir à luz, ser apuradas, e o Judiciário tem que fazer a sua parte no sentido de punir os responsáveis, como tem sido feito em outros países, sobretudo Argentina e Uruguai", afirmou Erundina.

A deputada disse ainda que o prazo dado para o funcionamento da Comissão da Verdade – de dois anos – é muito curto para que o grupo analise violações ocorridas num período de 43 anos.

*Fonte: Agência Câmara
Reportagem - Renata Tôrres/Rádio Câmara
Edição – Daniella Cronemberger

30/11/2011

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Mortalidade materna no Brasil


Estudo sobre mortalidade materna no Brasil, divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em setembro de 2011, registra que, entre 1990 e 2008, a taxa passou de 120 mortes por 100 mil nascimentos para 58, o que representa uma redução média anual de 4% no período.


 Artigo publicado no jornal Brasil Econômico em 29/11. Assinado por Dep. Luiza Erundina e Muna Zeyn, assistente social e membro do Comitê Estadual de Combate à Morte Materna e Infatil.


Não deixa de ser positivo, porém, com esse ritmo de queda o Brasil não conseguirá cumprir a meta do milênio estabelecida pela ONU de reduzir a taxa de mortalidade em 75% até 2015. São diversas as causas da mortalidade materna no Brasil e entre as mais importantes está a falta de assistência adequada durante a gestação e no momento do parto.

É inaceitável e injusto que em pleno século 21, quando a ciência e o desenvolvimento, em todos os aspectos, atingiram níveis incríveis, ainda morram tantas mulheres de parto. São frequentes os casos, inclusive em cidades como São Paulo, a mais rica do país, em que, ao chegar as primeiras dores do parto, a mulher fica a peregrinar de hospital em hospital à procura de um leito onde possa ter seu filho. E ao ser finalmente atendida, depois de horas e horas de grande sofrimento, não encontra mais forças para suportar o trabalho de parto e acaba falecendo ela e o filho antes de nascer. No sentido de eliminar essa inominável injustiça e grave violação a um direito humano fundamental, e em cumprimento ao que determina a Constituição Federal, no artigo 196 que define ser dever do Estado garantir o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, apresentamos, em 2004, projeto de lei na Câmara dos Deputados dispondo sobre o direito da gestante ao conhecimento e a vinculação à maternidade onde receberá assistência no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

Aprovado pelas duas Casas do Congresso Nacional, transformou-se na Lei nº 11.634, de 27 de dezembro de 2007, sancionada pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Popularmente conhecida como a "Lei do Parto", representa inestimável conquista das mulheres brasileiras das classes populares que têm nesse estatuto legal o reconhecimento formal de um direito humano e social fundamental. Contudo, quatro anos de vigência da lei, mulheres continuam morrendo ao serem atendidas depois de percorrer horas e horas as ruas da cidade, de táxis ou de ônibus, em busca de um leito em maternidades quase sempre lotadas e sem condições adequadas para realizar partos complicados e de alto risco.

Como se vê, não basta existir a lei para que um direito esteja assegurado. É preciso ainda que os cidadãos e cidadãs conheçam a lei e se apropriem dela; fiscalizem sua aplicação e exijam do Estado políticas públicas que propiciem as condições necessárias à eficácia do marco legal e a efetivação de um determinado direito.

Ademais, a maternidade segura e em condições humanas adequadas, além de ser um direito à plena realização da mulher como pessoa, é também uma função social e, como tal, responsabilidade do Estado de oferecer os meios necessários à reprodução humana, em condições dignas e justas a todas as mulheres da sociedade.


terça-feira, 22 de novembro de 2011

Ley de Medios: Câmara censura Comparato


Publicado no blog "Conversa Afiada" de Paulo H. Amorim
Este ansioso blogueiro recebeu o seguinte e-mail do professor Comparato:

Caro amigo:
A Deputada Luiza Erundina, após muita insistência junto à Comissão de Ciência, Tecnologia, Informática e Comunicação da Câmara dos Deputados, conseguiu que esta convocasse uma audiência pública para a discussão do escandaloso arrendamento de concessões de rádio e televisão no país. A Deputada teve, no entanto, a imprudência de me indicar para participar dessa audiência.

Bem, a citada Comissão começou enviando-me uma mensagem, na qual informava que, em conformidade com o procedimento habitual da Casa, eu deveria pagar minha passagem para Brasília. Diante dos protestos da Deputada Luiza Erundina, o presidente da Comissão acabou fazendo uma exceção, e concordou em pagar minha ida à capital federal.

Hoje, sem surpresa nenhuma de minha parte, um funcionário da Comissão me telefonou para informar que a audiência pública havia sido cancelada (obviamente, por razões de necessidade ou utilidade pública…).

Segue de qualquer forma, como anexo, o texto da palestra que iria proferir na citada audiência pública.
 

Abraço,
 

Fábio Konder Comparato

COMUNICAÇÃO SOCIAL NO BRASIL: O DIREITO E O AVESSO

Fábio Konder Comparato*

“– Bem sei, mas a lei?

– Ora, a lei… o que é a lei, se o Senhor major quiser?…

O major sorriu-se com cândida modéstia.”

MANOEL ANTONIO DE ALMEIDA, Memórias de um Sargento de Milícias.


No conto O Espelho, de Machado de Assis, o narrador assevera a seus ouvintes espantados que cada um de nós possui duas almas. Uma exterior, que exibimos aos outros, e com a qual nos julgamos a nós mesmos de fora para dentro. Outra interior, raramente exposta aos olhares externos, que nos permite julgar o mundo e a nós mesmos, de dentro para fora.

Importa reconhecer que essa duplicidade, no exato sentido de algo dobrado ou dissimulado, tal como a metáfora do conto machadiano, encontra-se tanto em nosso caráter, quanto em nossa organização político-econômica.

É inegável que o caráter brasileiro contém um elemento de dissimulação constante nas relações sociais. Nossa afabilidade de maneiras, tão elogiada pelos estrangeiros, dissimula com frequência sentimentos de desinteresse e desprezo.

Já em matéria de organização político-econômica, sempre tivemos, desde a Independência, um duplo esquema institucional. Há, de um lado, o direito oficial, que é a nossa alma exterior exibida ao mundo. Mas há também, no foro interior de nossas fronteiras, um direito oculto, que acaba sempre por prevalecer sobre o direito oficial, quando este se choca com os interesses dos poderosos.

Creio que o exemplo mais conspícuo dessa duplicidade institucional ocorre nos meios de comunicação de massa.

A maioria das normas sobre a matéria, constantes da Constituição de 1988, é certamente de bom nível. Acontece, porém, que quase todas elas ainda carecem de regulamentação legislativa, vinte e três anos após a promulgação da Carta Constitucional. São armas descarregadas.

Como se isso não bastasse, em decisão de abril de 2009 o Supremo Tribunal Federal julgou que a lei de imprensa de 1967 havia sido tacitamente revogada com a entrada em vigor da Constituição de 1988. Ora, nessa lei de imprensa, como em todas as que a precederam, regulamentava-se o exercício do direito de resposta, inscrito no art. 5º, inciso V da Constituição. Em conseqüência, esse direito fundamental tornou-se singularmente enfraquecido.

Como bem lembrou Lacordaire na França no século XIX, numa época em que a burguesia montante já impunha a política de desregulamentação legislativa de todas as atividades privadas, “entre o rico e o pobre, entre o forte e o fraco, é a lei que liberta e é a liberdade que oprime”. De que serve, afinal, uma Constituição, cujas normas não podem ser aplicadas pela ausência de leis regulamentares? Ela existe, segundo a clássica expressão francesa, como trompe l’oeil, mera ilusão pictórica da realidade.

Inconformado com essa negligência indesculpável do órgão do Poder Legislativo – negligência que, após mais de duas décadas da entrada em vigor da Constituição, configura uma autêntica recusa de legislar – procurei duas entidades, que são partes constitucionalmente legítimas para propor ações dessa espécie: o PSOL e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Comunicação e Publicidade. Elas aceitaram ingressar como demandantes perante o Supremo Tribunal Federal, onde tais ações foram registradas como ADO nº 9 e ADO nº 10.

Qual não foi, porém, meu desencanto quando, intimados a se pronunciar nesses processos, tanto a Câmara dos Deputados, quanto o Senado Federal, tiveram a audácia de declarar que não havia omissão legislativa alguma nessa matéria, pois tudo transcorria como previsto no figurino constitucional!

Acontece que, para cumular o absurdo, a duplicidade no campo da comunicação social não se reduz apenas ao apontado descompasso entre a Constituição e as leis.

Se considerarmos em particular o estatuto da imprensa, do rádio e da televisão, encontraremos o mesmo defeito: o direito oficial é afastado na prática, deixando o espaço livre para a vigência de um direito não declarado, protetor dos poderosos.

A Constituição proíbe ao Poder Público censurar as matérias divulgadas pelos meios de comunicação de massa. Mas os controladores das empresas que os exploram, estes, são livres de não divulgar ou de deformar os fatos que contrariem seus interesses de classe.

Como não cessa de repetir Mino Carta, este é o único país em que os donos da grande imprensa, do rádio ou da televisão fazem questão de se dizer colegas dos jornalistas seus empregados, embora jamais abram mão de seu estatuto de cidadãos superiores ao comum dos mortais.

Cito, a propósito, apenas um exemplo. Em fevereiro de 2009, o jornal Folha de S.Paulo afirmou em editorial que o regime empresarial-militar, que havia assassinado centenas de opositores políticos e torturado milhares de presos, entre 1964 e 1985, havia sido uma “ditabranda”. Enviei, então, ao jornal uma carta de protesto, salientando a responsabilidade do diretor de redação por aprovar essa opinião ofensiva à dignidade dos que haviam sido torturados, e dos familiares dos mortos e desaparecidos. O jornal publicou minha carta, acrescida de uma nota do diretor de redação, na qual eu era gentilmente qualificado de “cínico e mentiroso”. Revoltado, ingressei com uma ação judicial de danos morais, quando tinha todo o direito de apresentar queixa-crime de injúria. Pois bem, minha ação foi julgada improcedente, em primeira e em segunda instâncias. Imagine-se agora o que teria acontecido se as posições fossem invertidas, ou seja, se eu tivesse tido o destrambelho de insultar publicamente o diretor de redação daquele jornal, chamando-o de cínico e mentiroso!

A lição do episódio é óbvia: a Constituição reza que todos são iguais perante a lei; no mundo dos fatos, porém, há sempre alguns mais iguais do que os outros.

Vejamos, agora, nesse quadro institucional dúplice, o funcionamento dos órgãos de rádio e televisão.

Dispõe o art. 21, inciso XII, alínea a, que “compete à União explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens”.

No quadro constitucional brasileiro, por conseguinte, a exploração dessas atividades constitui um serviço público; isto é, no sentido original e técnico da expressão, um serviço prestado ao povo. E a razão disso é óbvia: as transmissões de radiodifusão sonora ou de sons e imagens são feitas através de um espaço público, isto é, de um espaço pertencente ao povo. Escusa lembrar que, como todo bem público, tal espaço não pode ser objeto de apropriação privada.

Da disposição constitucional que dá à radiodifusão sonora e da difusão de sons e imagens a natureza de serviço público decorrem dois princípios fundamentais.

Em primeiro lugar, o Estado tem o dever indeclinável de prestá-lo; e toda concessão ou permissão para que particulares exerçam esse serviço é mera delegação do Poder Público. Assim dispôs, aliás, a Lei nº 8.987, de 1995, que regulamentou o art. 175 da Constituição Federal para as concessões de serviços públicos em geral.

Em segundo lugar, na prestação de um serviço público, a realização do bem comum do povo não pode subordinar-se às conveniências ou aos interesses próprios daqueles que os exercem, quer se trate de particulares, quer da própria organização estatal (em razão de economia orçamentária, por exemplo).

Ora, neste país, desde o início do regime empresarial-militar em 1964, ou seja, antes mesmo da difusão mundial do neoliberalismo capitalista nas duas últimas décadas do século passado, instaurou-se o regime da privatização dos serviços de rádio e televisão. A presidência da República escolheu um certo número de apaniguados, aos quais outorgou, sem licitação, concessões de rádio e televisão. Todo o setor passou, assim, a ser controlado por um oligopólio empresarial, que atua não segundo as exigências do bem comum, mas buscando, conjuntamente, a realização de lucros e o exercício do poder econômico, tanto no mercado quanto junto aos Poderes Públicos.

Ainda hoje, todas as renovações de concessão de rádio e televisão são feitas sem licitação. Quem ganha a primeira concessão torna-se “dono” do correspondente espaço público.

A aparente justificação para esse abuso é a norma mal intencionada do art. 223, § 2º da Constituição, segundo a qual “a não-renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal”. Basta, porém, um minuto de reflexão para perceber que esse dispositivo não tem o efeito de suprimir a exigência de ordem pública, firmada no art. 175, segundo a qual todas as concessões ou permissões de serviço público serão realizadas mediante licitação.

Outra nefasta consequência dessa privatização dos serviços públicos de rádio e televisão entre nós, é que as autoridades públicas, notadamente o Congresso Nacional, decidiram fechar os olhos à difundida prática negocial de arrendamento das concessões de rádio e televisão, como se elas pudessem ser objeto de transações mercantis. Ora, tais arrendamentos, muitas vezes, dada a sua ilimitada extensão, configuram autênticas subconcessões de serviço público, realizadas com o consentimento tácito do Poder concedente.

Será ainda preciso repetir que os concessionários ou permissionários de serviço público atuam em nome e por conta do Estado, e não podem, portanto, nessa qualidade, buscar a realização de lucros, preterindo o serviço ao povo? O mais chocante, na verdade, é que o Ministério Público permanece omisso diante dessa afrontosa violação de normas constitucionais imperativas.

Sem dúvida, o direito brasileiro (Lei nº 8.987, de 13/02/1995, art. 26) admite é a subconcessão de serviço público, mas desde que prevista no contrato de concessão e expressamente autorizada pelo poder concedente. A transferência da concessão sem prévia anuência do poder concedente implica a caducidade da concessão (mesma lei, art. 27).

Mesmo em tais condições, uma grande autoridade na matéria, o Professor Celso Antonio Bandeira de Mello, enxerga nesse permissivo legal da subconcessão de serviço público uma flagrante inconstitucionalidade, pelo fato de burlar a exigência de licitação administrativa (Constituição Federal, art. 175) e desrespeitar com isso o princípio da isonomia.

Para se ter uma idéia da ampla mercantilização do serviço público de televisão entre nós, considerem-se os seguintes dados de arrendamento de concessões, somente no Estado de São Paulo:


BANDEIRANTES: 24 horas e 35 minutos por semana (tempo estimado)

2a a 6a feira

5h45 – 6h45 (Religioso I)

20h55 – 21h20 (Show da Fé)

2h35 (Religioso II)

Sábado e domingo

5h45 – 7h (Religioso III)

4h (Religioso IV)


REDE TV!: 30 horas e 25 minutos por semana (tempo estimado)

Domingo

6h – 8h – Programa Ultrafarma

8h – 10h – Igreja Mundial do Poder de Deus

10h – 11h – Ultrafarma Médicos de Corpos e Alma

16h45 – 17h – Programa Parceria5

3h – Igreja da Graça no Seu Lar

2a e 3ª feiras

12h – 14h – Igreja Mundial do Poder de Deus

14h – 15h – Programa Parceria 5

17h10 – 18h10 – Igreja da Graça – Nosso Programa

1h55 – 3h – Programa Nestlé

3h – Igreja da Graça no Seu Lar

4a feira

12h – 14h – Igreja Mundial do Poder de Deus

14h – 15h – Programa Parceria 5

17h10 – 18h10 – Igreja da Graça – Nosso Programa

3h – Igreja da Graça no Seu Lar

5a e 6ª feiras

12h – 14h – Igreja Mundial do Poder de Deus

17h10 – 18h10 – Igreja da Graça – Nosso Programa

3h – Igreja da Graça no Seu Lar

Sábado

7h15 – 7h45 – Igreja Mundial do Poder de Deus

7h45 – 8h – Tempo de Avivamento

8h – 8h15 – Apeoesp – São Paulo

8h15 – 8h45 – Igreja Presbiteriana Verdade e Vida

8h45 – 10h30 – Vitória em Cristo

10h30 – 11h – Igreja Pentecostal

11h – 11h15 – Vitória em Cristo 2

12h – 12h30 – Assembléia de Deus do Brasileiro

12h30 – 13h30 – Programa Ultrafama

2h – 2h30 – Programa Igreja Bola de Neve

3h – Igreja da Graça no Seu Lar


TV GAZETA: 37 horas e 5 minutos por semana

2a a 6ª feiras

6h – 8h – Igreja Universal do Reino de Deus

20h – 22h – Igreja Universal do Reino de Deus

1h – 2h – Polishop

Sábado

6h – 8h – Igreja Universal do Reino de Deus

20h – 22h – Igreja Universal do Reino de Deus

23h – 2h – Polishop

Domingo

6h – 8h – Igreja Universal do Reino de Deus

8h – 8h30 – Encontro com Cristo

14h – 20h – Polishop

0h – 2h – Polishop


A lição a se tirar dessa triste realidade é bem clara: os meios de comunicação social, neste país, permanecem alheios aos princípios e regras constitucionais.

Para a correção desse insuportável desvio, é indispensável e urgente tomar três providências básicas.

Em primeiro lugar, impõe-se, na renovação das concessões ou permissões do serviço de radiodifusão sonora, ou de sons e imagens, cumprir o dispositivo de ordem pública do art. 175 da Constituição Federal, que exige a licitação pública.

Em segundo lugar, é preciso pôr cobro à escandalosa prática de arrendamento de concessões de rádio e televisão.

Em terceiro lugar, como foi argüido nas ações de inconstitucionalidade por omissão, acima mencionadas, é urgente fazer com que o Congresso Nacional rompa a sua prolongada mora em cumprir o dever constitucional de dar efetividade aos vários dispositivos da Constituição Federal carentes de regulamentação legislativa, a saber:

1)O art. 5º, inciso V, sobre o direito de resposta;

2)O art. 220, § 3º, inciso II, quanto aos “meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente;

3)O art. 220, § 5º, que proíbe sejam os meios de comunicação social, direta ou indiretamente, objeto de monopólio ou oligopólio;

4)O art. 221 submete a produção e programação das emissoras de rádio e televisão aos princípios de: “I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

É o mínimo que se espera nessa matéria dos nossos Poderes Públicos, como demonstração de respeito à dignidade do povo brasileiro.

Brasília, 22 de novembro de 2011.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Deputada Luiza Erundina participa do seminário de encerramento do Curso de Direitos Humanos 2011




Luiza Erundina participou neste sábado (19) do seminário de encerramento do Curso de Direitos Humanos 2011 realizado pela Associação Cantareira (www.cantareira.org). A deputada palestrou sobre o Tema Políticas Públicas de Direitos Humanos: a participação popular na efetivação de direitos. 

O seminário encerra o Projeto Agente Comunicadores dos Direitos Humanos, fruto de emenda parlamentar do mandato, aprovado no final de 2010 e desenvolvido em 2011.