sábado, 29 de janeiro de 2011

Erundina defende instalação de Comissão da Verdade



O Brasil já reúne todas as condições para instalar sua própria Comissão da Verdade e investigar os crimes praticados durante a ditadura militar. Foi o que sustentaram a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) e o senador Pedro Simon (PMDB-RS) no Seminário Internacional sobre Comissões da Verdade, promovido nesta terça-feira pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
Erundina espera que no início de 2011 comece a funcionar a comissão especial da Câmara encarregada de analisar o Projeto de Lei 7376/10, do Executivo, que prevê a criação da Comissão Nacional da Verdade. “Já temos o Plano Nacional dos Direitos Humanos-3 (PNDH-3), que expressa o acúmulo das lutas de milhares de militantes dos direitos humanos”, disse Erundina. Para ela, tanto o novo governo como a nova legislaturaEspaço de tempo durante o qual os legisladores exercem seu poder. No Brasil, a duração da legislatura é de quatro anos. do Congresso Nacional favorecem a Comissão da Verdade.
O projeto prevê que a comissão será criada no âmbito da Casa Civil da Presidência da República para esclarecer casos de violação de direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988 – inclusive a autoria de tortura, mortes, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres.
“Hoje nós vivemos uma época normal e já podemos buscar a verdade, sem qualquer sentimento de ódio ou de vingança; o país que não conhece sua história não pode caminhar para a frente”, sublinhou Pedro Simon.
Manobra
O senador sustentou que a anistia de 1979 não foi fruto de um amplo entendimento político e social - como argumentam os que nada querem investigar. “É uma mentira, a anistia foi uma vitória do general Figueiredo”, disse Simon.
Ele lembrou que o projeto de anistia da oposição, na época, perdeu na Câmara por apenas cinco votos. “A ditadura usou o apoio dos lideres políticos exilados, que queriam regressar, para aprovar o seu próprio projeto”, recordou.
Segundo Simon, a oposição ficou em situação delicada, mas não abriu mão dos princípios éticos: “os grandes empresários e a grande imprensa ficaram contra nós, mas nós nunca admitimos anistia à tortura”, afirmou.
O senador elogiou o projeto de lei encaminhado pelo Executivo, mas sugeriu duas mudanças: que a comissão fique vinculada ao Ministério da Justiça, e não à Casa Civil; e que os sete integrantes a serem indicados pelo Executivo tenham seus nomes aprovados pelo Congresso.
Recuo tático
Luiza Erundina prevê que a luta pela instalação da comissão não será fácil. Prova disso, citou, foi o nível das intervenções, na parte da manhã do seminário, de alguns deputados contrários, “que tivemos o mal-estar de ouvir”.
“É preciso reagir com energia, com vigor, contra os que tentam desqualificar a luta pelos direitos humanos”, receitou a deputada. Segundo Erundina, no primeiro semestre de 2010 o governo foi obrigado a um “recuo tático” em relação à comissão, mas a partir de agora será possível dar um “salto de qualidade” em relação ao tema.
Operação Condor
“Dos países envolvidos na Operação CondorAliança de vários regimes militares da América do Sul (Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai) para coordenar a repressão a opositores de extrema-esquerda (subversivos), montada a partir do início dos anos 1970. A operação durou até a onda de redemocratização na década seguinte., só falta o Brasil”, observou a diretora da Comissão da Verdade de El Salvador, argentina Patricia Tappatá de Valdez, ao defender a instalação deste tipo de comissão também no Brasil.
Ela disse que o Brasil também precisa investigar as violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar, a exemplo do que fazem Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, os outros países da Operação Condor.
Segundo Patricia Valdez, o atual momento é crucial para o Brasil. “Conhecer a verdade é uma dupla necessidade: para cumprir a obrigação de investigar, cobrada nos meios internacionais; e para garantir o direito à reparação”, afirmou. Ela acrescenta que a Comissão da Verdade tem um valor pedagógico essencial para a vida democrática. “Em todos os países tem sido assim”, disse.
Perigo para a democracia
O diretor do Programa Verdade e Memória do International Center for Transitional Justice (organização que trabalha para reparar e prevenir violações de direitos humanos em governos de transição), o peruano Eduardo González, contestou o argumento dos que dizem que a instalação da Comissão da Verdade prejudicaria a estabilidade política e seria um desrespeito à lei da anistia de 1979. “As comissões da Verdade nunca causaram guerra civil nem violência, em país algum; ao contrário, em todos os países os resultados foram positivos, contribuíram para reforçar as instituições e retirar da cena política elementos perigosos para a democracia”, disse. Na opinião de González, “o que ameaça a democracia não é a verdade, mas a persistência da impunidade.”
Relegitimação
O vice-ministro da Justiça e Desenvolvimento Constitucional da África do Sul, Andries Carl Nel, falou sobre a Comissão de Verdade que operou em seu país entre os anos 1995 e 1997, logo após a queda do apartheid. Ele concluiu dizendo que o processo serviu para “relegitimar as instituições”.
“Queremos que o Brasil consiga fazer melhor que nós”, manifestou Nel, e em seguida convidou a Comissão de Direitos Humanos a enviar uma delegação a seu país para aprofundar o entendimento de como lá funcionou a comissão.
Também esteve presente o embaixador da África do Sul no Brasil, Mochubela Seekoe, que completou a exposição sobre a comissão da Verdade daquele país. Ele contou que, no trabalho de identificação das ossadas das vítimas do apartheid, os africanos contaram com o auxílio de uma equipe especializada argentina, a mesma que identificou os restos de Ernesto Che Guevara.
O evento foi promovido em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça e a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.

Fonte: Agência Câmara e Assessoria de Imprensa da Deputada Federal Luiza Erundina

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