quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Pronunciamento no Plenário - PEC 270 e Comissão da Verdade

A Deputada Federal Luiza Erundina em seu pronunciamento na câmara dos deputados, na tarde desta quinta-feira (27/10/2011), tratou de um importante e relevante tema, a Comissão da Verdade. Antes, porém, fez questão de saudar os servidores públicos pelo dia 28 de outubro, dia dedicado a todos aqueles que atuam e atuaram nas esferas de governo. Recordou a PEC 270, que garante ao servidor que se aposentar por invalidez permanente, o direito dos proventos integrais com paridade.

Comissão da Verdade

Foi aprovada, no senado, no dia 26 de outubro, a Comissão Nacional da Verdade, nos termos em que estava quando foi aprovada na Câmara, em regime de urgência urgentíssima. A Deputada Erundina lamentou o fato do relator do projeto no senado, o senador Aloysio Nunes, a não propor qualquer tipo de alteração e, admitir a possibilidade da comissão ser composta por militares, fato este, segundo ela, inadmissível e absurdo.

Comentou ainda as notícias que chegam do Uruguai e Argentina. No Uruguai, a Câmara dos Deputados aprovou o fim da prescrição de crimes da ditadura enquanto que na Argentina, oito anos após a lei de anistia ser derrubada, a Justiça condenou 18 militares por tortura e homicídios, inclusive alguns à prisão perpétua.  A deputada afirmou ainda, que estes dois países estão à frente do Brasil no que se refere a Comissão da Verdade. Equipe LE

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quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Deputada Luiza Erundina é citada em pesquisa dirigida à jovens sobre figuras inspiradoras de suas vidas

* Coluna de Mônica Bergamo - Folha de São Paulo 26/10/2011
 
TÔ FORA
O Instituto Democracia e Sustentabilidade, de Marina Silva, realizou pesquisa com cem jovens (18 a 25 anos) de SP sobre como eles veem a política. A maioria, mesmo entre aqueles que atuam em grêmios de escola, igrejas ou fazem trabalho comunitário, descarta se candidatar um dia. Associam política a corrupção e citaram palavras como "raiva", "nojo", "ódio" e "vergonha".

JESUS POLÍTICO
Quando perguntados sobre figuras inspiradoras de suas vidas, os jovens citaram primeiro pais, mães e avós e depois celebridades como Ronaldo, Silvio Santos, Cazuza e Rodrigo Faro. Jesus Cristo foi citado como "político", ao lado de Lula, Mandela, Gandhi, Luiza Erundina e da própria Marina Silva. Esses personagens são reconhecidos por sua "luta", com características semelhantes às de seus familiares.

Seminário Internacional | "DE LA CUOTA A LA PARIDAD" - Paraguay 24 e 25 de Outubro de 2011


A Deputada Federal Luiza Erundina foi convidada a participar de Seminário Internacional "DE LA CUOTA A LA PARIDAD"  La parcicipacón Real de la Mujer, uma meta para alcanzar la Democracia realizado em Assunção no Paraguay nos dias 24 e 25 de Outubro. Veja o discurso na íntegra:



Saúdo todos os presentes, de modo especial as companheiras e agradeço o honroso convite da Secretaria da Mulher da Presidência da República deste querido país, irmão do Brasil, o Paraguai, para participar deste importante evento.

O tema do empoderamento político da mulher é de absoluta relevância, particularmente ao ser tratado na perspectiva da construção da democracia.
O tema que devo abordar é: “Avanços da paridade política e empoderamento da Mulher na conjuntura atual do Brasil”.

Em toda sociedade machista e patriarcal, como a sociedade brasileira, as mulheres têm sido, historicamente, relegadas à invisibilidade e ao silêncio. Confinadas nos espaços privados, elas sempre ficaram fora dos espaços públicos, submersas no silêncio e na invisibilidade da vida privada, dedicadas à família e pouco conscientes do próprio valor e do seu papel na sociedade. Aos poucos, essa invisibilidade e esse silêncio se rompem e as mulheres começam a emergir e a ocupar espaços públicos, antes reservados exclusivamente aos homens, tanto no mundo do trabalho como nos demais campos da vida em sociedade.

Ao tomar plena consciência de seus direitos como mulher, como trabalhadora e como cidadã, elas começam a se envolver em ações coletivas nos movimentos reivindicativos por direitos individuais, políticos e sociais.

Ao participar desses movimentos e fazer a luta por direitos, as mulheres adquirem autoestima, conscientizam-se e se formam politicamente. Tornam-se líderes em suas comunidades e passam a ser referência para outras companheiras.


As mulheres estão, hoje, no mercado de trabalho e nos sindicatos; participam de campanhas salariais, de greves, da lurta geral dos trabalhadores, porém estão fora das instâncias de direção, dos espaços de poder, historicamente, destinados aos homens e quase exclusivamente ocupados por eles.

Ao apoderar-se dos espaços públicos, as mulheres tomam consciência do seu papel político na sociedade e de que precisam disputar e conquistar poder como condição para garantir seus direitos, afirmando-se, assim, como sujeito social e político.

De todas as barreiras à participação das mulheres, a da política é, sem dúvida, a mais difícil de transpor, exatamente por ser a política o espaço das decisões e do poder e, como tal, tem sido privilégio dos homens.

No Brasil, as mulheres são mais da metade da população e do eleitorado, têm maior nível de escolaridade e representam quase 50% da população economicamente ativa do país. No entanto, estão subrepresentadas nas esferas de poder. São apenas 11% no Congresso Nacional; não chegam a 20% nos níveis mais elevados do Poder Executivo, no Judiciário, nas Universidades, nos sindicatos e, nas empresas privadas, ocupam apenas 20% das chefias.

Pesquisa divulgada em novembro de 2006, pelo Fórum Econômico Mundial, órgão vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), coloca o Brasil em 67% lugar no ranking que registra a igualdade entre os sexos em 115 países, a partir de quatro indicadores: participação na política e na economia; acesso à educação e à saúde.

Nos quatro aspectos analisados, a igualdade em termos de saúde - que leva em conta a expectativa de vida e a taxa de nascimento de cada sexo – é a única em que o Brasil se sai bem. Já no que se refere à participação política – medida pelo número de mulheres ocupando cargos parlamentares, ministeriais e de chefe de Estado, o país cai para o 86º lugar. Fica atrás da Colômbia, Argentina, Venezuela, Peru, Paraguai e Uruguai que têm mais igualdade entre homens e mulheres.

Registram-se, porém, alguns avanços em termos de participação política das mulheres, ainda que com atraso e num ritmo muito lento.

Em 1995, foi aprovado o sistema de cotas para as eleições do ano seguinte, com reserva de 20% de vagas para as mulheres. A partir de 1997, seguindo tendência mundial, a reserva passa a ser de, no mínimo, 30% e no máximo 70%, para candidaturas de cada sexo. Trata-se, entretanto, de uma conquista meramente formal, já que os partidos não a cumprem, sem que, por isso, sofram qualquer sanção. Além disso, as mulheres não dispõem de condições objetivas para superar dificuldades nas disputas eleitorais, tais como, falta de recursos financeiros, insuficiente capacitação política, invisibilidade na mídia.

Em 2009, foi aprovada uma reforma eleitoral que estabeleceu novas regras e ações afirmativas de interesse das mulheres, que passaram a valer nas eleições de 2010.

Na lei de 2007, denominada lei de cotas para mulheres, constava apenas a reserva 30% de vagas. Com a nova lei, os partidos são obrigados a preenchê-las, sob pena de não terem suas chapas de candidaturas registradas pela justiça eleitoral.

Além disso, os partidos têm que destinar 5% dos recursos do Fundo Partidário à criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres. O partido que não cumprir esse dispositivo deverá, no ano subseqüente, adicionar mais 2,5% do Fundo Partidário para tal destinação. Ademais, os partidos devem reservar ao menos 10% do tempo de propaganda partidária para promover e difundir a participação política feminina.

Outro indicador significativo da exclusão das mulheres brasileiras nos espaços públicos de poder é o fato de que em toda a história do poder legislativo no Brasil – mais de 185 anos - somente em 2011 uma deputada ocupa cargo, como titular, na composição da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Em todos esse tempo, apenas quatro foram eleitas para cargo de suplente.

No nosso atual quadro partidário, as mulheres não têm chance de ampliar sua participação política. São poucas em cargos de direção dos partidos, quase exclusivamente ocupados por homens que se perpetuam neles. Evidentemente, a responsabilidade por isso não é só dos homens. É também das mulheres que não se lançam nas disputas partidárias internas, preferindo apoiar e eleger dirigentes homens, talvez por insegurança ou, até mesmo, baixa estima quando
se trata de disputar poder. Essa atitude também poderá significar incompreensão do seu papel político na sociedade e da necessidade de ter poder para que seus direitos sejam assegurados.

As mulheres, geralmente, são educadas e formadas para assumir funções e cumprir tarefas nos espaços privados, aceitando, passivamente, a condição de auxiliares dos homens que, por sua vez, são educados e formados para ocupar os espaços públicos e exercer liderança. Isso, porém, não deve ser aceito pelas mulheres como algo natural. Precisam romper com essas determinações socioculturais e se prepararem para disputar e conquistar poder e, assim, se assumirem como sujeitos políticos na sociedade. Para tanto, devem se interessar por política e, até mesmo, filiar-se a partidos se quiserem, de fato, influir no processo político e na definição dos rumos da vida do país.

É verdade, entretanto, que as tarefas e responsabilidades atribuídas às mulheres pela sociedade exigem dedicação integral, negando-lhes o tempo necessário à militância política. E para mudar isso, é preciso exigir igualdade de direitos com os homens, inclusive dividindo com eles as tarefas e responsabilidades impostas pela vida privada, de modo a poder participar da vida pública que, desde sempre, tem sido delegada, quase que exclusivamente, aos homens.

É necessário, ainda, que as mulheres modifiquem sua atitude diante da vida e na relação com os homens. Isso no interesse não só das mulheres, mas também dos homens e de toda a sociedade, que só será verdadeiramente justa e democrática quando homens e mulheres tiverem igualdade de oportunidades, inclusive em termos de participação política e no exercício do poder em qualquer esfera da sociedade.

Ademais, temos que nos opor à forma patriarcal, autoritária e centralizadora como, tradicionalmente, o poder é exercido, seja  nos partidos, seja nos demais espaços de poder. Isso requer mudança de cultura política e cumpre às mulheres contribuir nesse sentido. Não basta disputar e conquistar poder político. É preciso transformar o poder, ou seja, exercê-lo de forma diferente, rompendo com o autoritarismo e a centralização que têm caracterizado a prática política e o exercício do poder em nossas sociedades. A inserção das mulheres no mundo da política deve significar, portanto, a oportunidade de se construir um novo paradigma para as relações políticas e o exercício do poder.

A experiência da bancada feminina na Câmara dos Deputados já  apresenta mudança de comportamento que expressa novos valores no exercício de mandatos parlamentares, rompendo com certas práticas da política tradicional com viés machista: competitiva, autoritária e excludente.

As deputadas que compõem a bancada feminina atuam de forma unitária e cooperativa, sob a coordenação de um coletivo de parlamentares que representam as diferentes bancadas partidárias da Câmara dos Deputados. As iniciativas de cada Deputada são apoiadas pelas outras, além de ações conjuntas, em torno de propostas de interesse comum, que são encaminhadas suprapartidariamente pela bancada.

Outro aspecto que caracteriza a atuação da bancada feminina é sua articulação com as entidades feministas e movimentos de mulheres, seja no encaminhamento das ações que compõem a agenda de interesse comum, seja na elaboração da proposta orçamentária anual. Definem, conjuntamente, as prioridades e emendas ao Orçamento da União, destinando recursos para os programas e ações do governo voltadas às políticas de gênero. Nesse sentido a bancada também se articula com a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, tendo como referência o “Plano Nacional de Políticas para as Mulheres”.

Estes são aspectos que marcam diferenças importantes na atuação parlamentar das mulheres, contribuindo, assim, para mudar a cultura política que determina a convivência e as relações nos espaços públicos e na forma de exercer o poder, tornando-as mais solidárias e democráticas.

Fruto dos movimentos de mulheres e feminista ao longo da sua trajetória de lutas por direitos e por igualdade de gênero e de raça no país, vale destacar, ainda, as valiosas conquistas da Constituição Federal de 1988, marco político institucional que consagrou os direitos humanos como fundamento da nação brasileira e os direitos das mulheres como essencialmente direitos humanos.

Não obstante essas importantes conquistas que impactaram positivamente a vida das mulheres brasileiras, nas esferas pública e privada persistem os obstáculos ao pleno exercício de sua cidadania. Destacam-se, entre outros, as desigualdades de gênero em relação aos direitos civis e políticos; à sexualidade e reprodução humana; ao acesso ao mercado de trabalho e direitos trabalhistas e previdenciários. Isso porque a garantia desses direitos depende de políticas públicas e de ações de governo que, por sua vez, supõem poder político.

Registre-se, porém, a criação de mecanismos institucionais de relevante importância para a adoção de políticas públicas voltadas à redução das desigualdades de gênero e de raça nas diversas áreas da vida social: a Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher, criada em 2002 e transformada, em 2003, em Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres; e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, em 2003, cujos titulares têm status de ministro.

Essas e outras conquistas são frutos da luta memorável dos movimentos de mulheres e feministas, ao longo de mais de oito décadas. Em 1928, quando mulheres sequer tinham o direito de votar, foi eleita Alzira Soriano prefeita de Lajes, no Rio Grande do Norte, primeira mulher da América Latina a assumir o governo de uma cidade. Em 2010, oitenta e dois anos depois, elege-se Dilma Roussef primeira presidente do Brasil. Ela começou seu discurso de posse com as seguintes palavras: “Pela decisão soberana do povo, hoje será a primeira vez que a faixa presidencial cingirá o ombro de uma mulher. (...) A valorização da mulher melhora a nossa sociedade e valoriza nossa democracia.

Concluímos afirmando que a política é o meio mais eficaz para se transformar a sociedade no interesse das mulheres e dos demais setores excluídos. Por isso, precisamos nos inserir no mundo da política, o que exige formação e coragem para enfrentarmos discriminação e preconceito; por ousarmos disputar o poder com os homens num campo que tem sido quase exclusivamente seu. Esse é o maior desafio a superar.

Luiza Erundina
Deputada Federal PSB/SP




terça-feira, 18 de outubro de 2011

*Publicado por Daniel Nagase, Dario de Negreiros e Rafael Schincariol, especial para o Viomundo - 17/102011

Paulo Abrão: Comissão da Verdade deve investigar empresas que financiaram a ditadura


Paulo Abrão, Luiza Erundina, Edson Teles e Paulo Arantes no debate “Ditadura, democracia e resistência para Quem”


O Secretário Nacional de Justiça, Paulo Abrão, afirmou que a Comissão da Verdade deve investigar as empresas privadas que financiaram a ditadura civil-militar. Abrão sugeriu a formação de 12 comitês especiais que também apurariam, dentre outras coisas, os atos de terrorismo de Estado –como o atentado ao Riocentro– e o apoio de outros países ao regime, em especial na Operação Condor.

Recentemente aprovado na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 7.376, que cria a Comissão da Verdade, deve ser votado nesta terça-feira (18/10) no Senado. De acordo com o projeto, a comissão terá a função de “examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período de 1946 a 1988”. Ela não poderá, no entanto, punir os criminosos.

Ainda assim, Abrão afirma que a comissão pode ajudar a constituir um conjunto de provas contra os assassinos e torturadores do regime. Para ele, um dos principais pontos positivos do projeto atual é justamente a possibilidade de se atribuir autoria aos crimes cometidos. “Sem justiça, a verdade é inalcançável”, disse, ressaltando a importância da luta pela punição dos criminosos.

O secretário afirmou ainda que nenhum militar deve ser chamado para compor a Comissão e sugeriu que a presidenta Dilma realize um processo de consulta pública para a escolha das sete pessoas que formarão o grupo. “Não pode, não deve haver militares na Comissão”.

As afirmações foram feitas durante debate na Assembleia Legislativa de São Paulo no dia 08/10 (sábado). Participaram também a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) e os professores Edson Teles, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), e Paulo Arantes, da USP. O debate faz parte da série de encontros “Ditadura, democracia e resistência para Quem”, organizada pelo coletivo político Quem.

“Alguém tem dúvida do Sarney?”
Erundina, que fez sua fala logo após a de Abrão, não poupou críticas ao projeto e ao governo. Segundo ela, a votação na Câmara teria sido feita a toque de caixa para que o projeto não fosse nem alterado, nem discutido. “O projeto entrou na câmera, em maio de 2010. De lá pra cá, nada mais aconteceu a não ser uma votação improvisada, em uma sessão de final de noite, em regime de urgência urgentíssima”.

A deputada elogiou a presença de um representante do Ministério da Justiça no debate, mas lamentou que o diálogo com o governo não tenha acontecido antes. “Lamento a ausência de Paulo Abrão em outros momentos. Ele traz informações do Ministério da Justiça que não tivemos desde que o projeto entrou na Câmara”, disse. “Quem sabe agora o governo tenha percebido que não dá pra fazer as coisas como ele vinha fazendo.”

Autora de várias emendas que alterariam diferentes pontos do projeto –todas rejeitadas pela Câmera–, Erundina criticou o número reduzido de integrantes da comissão, previsto pelo projeto. “É um absurdo que uma comissão responsável por cobrir todo o país tenha só sete membros e 14 funcionários”.

Ainda mais enfática, a deputada sugeriu que a composição demasiadamente heterodoxa da base de apoio do governo, que contaria inclusive com ex-apoiadores da ditadura, é uma das causas pelas quais o projeto de lei seria tão problemático. “Os governos do PT têm uma base de sustentação tão larga, tão heterogênea, que contam até mesmo com aqueles que patrocinaram e promoveram a tortura, os assassinatos e os desaparecimentos. Alguém tem dúvida do Sarney?”.

Para a votação desta terça-feira no Senado, Erundina afirmou que mais uma vez nenhuma alteração deve ser aceita. “Se o governo agiu desta forma até agora, não tenhamos ilusões de que será diferente no Senado. Uma virgula sequer será alterada, porque senão o projeto voltaria para a Câmara.”

“Quem foi que deu o golpe?”
Para o professor Edson Teles, o projeto de lei que cria a Comissão da Verdade é marcado pelo casuísmo. Isto porque ele foi enviado ao Congresso dias antes de a Corte Interamericana de Direitos Humanos se reunir para decidir o Caso Araguaia. Além disso, Teles lembrou que o projeto ficou parado na Câmara por um ano e quatro meses e só foi enviado para votação às vésperas do discurso de abertura da reunião anual da ONU, feito por Dilma.

Na opinião do filósofo Paulo Arantes, os trabalhos da Comissão da Verdade deveriam se pautar pela pergunta que dá nome ao coletivo político organizador do debate, o grupo Quem. “Quem foi que deu o golpe? Contra quem? Quem chamou [os militares]?”. Segundo Arantes, “não nos interessa apenas a identidade dos perpetradores de atrocidades e violações, mas interessa também saber quem acobertou, quem financiou, quem se beneficiou, quem encomendou a política de extermínio”.

Outro risco de vexame mundial



A Comissão da Verdade é falha, diz Dep. Luiza Erundina. Exemplo clássico é o da pernambucana Elzita Santa Cruz, de 97 anos, que até hoje ainda espera reencontrar seu filho desaparecido. Foto: Leo Caldas
A pernambucana Elzita Santa Cruz, de 97 anos, não muda de casa nem de telefone porque acredita que a qualquer momento chegará uma notícia sobre o filho Fernando, desaparecido aos 25 anos, na ditadura militar. Prêmio Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República por causa de sua luta, Elzita declarou apoio eleitoral à presidenta Dilma Rousseff em 2010. Na época, escreveu à candidata que Lula avançou pouco, mas tinha a “certeza” de que ela, eleita, não pouparia esforços para descobrir o paradeiro dos desaparecidos políticos do País.
A paraibana Luiza Erundina, de 77 anos, deputada federal pelo PSB, é uma das mais firmes referências nacionais na luta pela redemocratização do Brasil. Mas embarga a voz quando lembra de dona Elzita. Erundina está convencida de que o governo Dilma não dará conta da expectativa da amiga pernambucana. “Temo que esse arremedo de Comissão da Verdade e as meias verdades, que ela eventualmente possa apurar terminem acabando com a causa e o ânimo das pessoas.” As pessoas vão morrendo e as memórias, quando não preservadas, se apagam. Erundina conta que se entristece porque toda a luta das donas Elzitas não foi suficiente para que o Brasil criasse mecanismos que impeçam essa história de se repetir, seja como farsa, seja como tragédia. Nem de fazer realmente sua democratização. “Aqueles que patrocinaram a ditadura ainda estão no poder.”
A redemocratização ficará incompleta, até que a história seja conhecida pelos brasileiros. Foto: Ricardo Marques/Folhapress
CartaCapital: O Brasil terá uma Comissão da Verdade ou da Meia Verdade?
Luiza Erundina: Se o projeto aprovado na Câmara se mantiver nos mesmos termos, não há perspectivas de um resultado concreto ou justo em relação aos crimes e aos responsáveis por eles na ditadura. É insuficiente e inadequado. Por exemplo, o prazo das investigações, de 1946 a 1988, é muito amplo, pega desde a ditadura Vargas. E para apenas sete integrantes investigarem em dois anos. Os membros são escolhidos pela presidenta, sem nenhum mecanismo de consulta. A comissão não tem autonomia orçamentária, é totalmente subordinada à Casa Civil. Prevê a possibilidade de militares integrarem a comissão. E não se conseguiu mudar a interpretação da Lei da Anistia. Então não será feita Justiça.
CC: E há a condenação da Corte Interamericana…
LE: Sim. Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, no julgamento do caso da Guerrilha do Araguaia, condenou o Brasil a uma série de medidas de investigação, identificação dos responsáveis e da memória e da verdade sobre os crimes e exigiu, entre outras coisas, que a Lei da Anistia tenha outra interpretação. Na interpretação da OEA, a Lei da Anistia, de 1979, afetou o dever do Estado de investigar e punir. Então, a Ordem dos Advogados do Brasil entrou com uma ação no STF, requerendo um parecer nos termos exigidos pela OEA. E o STF decidiu, no fim de 2010, pela manutenção da interpretação atual.
CC: A senhora tem um projeto na Câmara para mudar isso, não?
LE: Sim, porque, como a lei atual está, mesmo que essa Comissão da Verdade venha a descobrir provas de assassinatos, os criminosos ficarão impunes, por causa da interpretação do STF. E o projeto de lei do governo Lula, apresentado em maio de 2010, para criar a Comissão da Verdade, foi retirado e aprovado no fim de uma sessão à noite, em regime de urgência urgentíssima, o que limitou ainda mais a possibilidade de se apresentarem emendas. O governo fez um rolo compressor para que o projeto fosse apresentado nesses termos. E negociaram com a oposição algumas emendas. Mas recusaram emendas de avanço.
CC: Qual o interesse do governo em aprovar a Comissão dessa forma?
LE: O que ouvimos é que ou se aprovava a proposta nos termos em que ela estava ou haveria dificuldades em razão da pressão da área militar. E que os termos teriam sido negociados pelo então ministro Nelson Jobim com a área militar. Assim, essa proposta que acabou apresentada pelo Lula foi para diluir a luta.
CC: Depois não houve só uma ação da direita, mas o próprio governo articulou contra o seu projeto…
LE: Sem dúvida. A defesa que os representantes do governo fizeram, na companhia, inclusive, de parlamentares ditos de esquerda, comunistas, alguns que até foram vítimas também… Olha, é inexplicável. Mas o governo baixou o rolo compressor nesse caso também. E outra coisa: conseguimos aprovar requerimentos da Comissão de Direitos Humanos da Câmara para fazer duas audiências públicas, uma sobre a Comissão da Verdade e a sentença da OEA e outra sobre o caso do Araguaia. E convidamos os ministros dos Direitos Humanos (Maria do Rosário), da Justiça (José Eduardo Cardozo) e das Relações Exteriores (Antonio Patriota). Eles absolutamente não compareceram. É muito frustrante. Acho que é simplesmente para se encerrar a discussão, para dar uma resposta meio enviesada à Corte da OEA. Agora, se a pressão crescer, pode ser que a comissão sirva para alguma coisa.
CC: Da forma como está, a Comissão da Verdade não corre o risco de enterrar a história, ao contrário de atender à decisão da OEA?
LE: Sim. O objetivo expresso no texto do projeto é resgatar a memória para ver a verdade histórica e fazer a reconciliação nacional. Sem tocar em justiça. É incrível, pois todos os países que sofreram ditaduras tiveram comissões da verdade com a perspectiva de fazer justiça: Argentina, Uruguai, África, Alemanha. A nossa preocupação é exatamente essa. A Comissão, tão cercada de cuidados para se enxergar a verdade por inteiro, pode ser pior que nada… Não dá para identificar responsáveis de crimes e não levá-los à Justiça. Temo que esse arremedo de -Comissão da Verdade, com as meias-verdades que, eventualmente, possam ser apuradas, acabe com a causa e o ânimo das pessoas. Têm familiares que ainda vivem sob a expectativa de informações sobre aqueles que se envolveram -naquele processo. Há o caso do Fernando Santa Cruz, por exemplo, cuja mãe, dona Elzita Santa Cruz, de 97 anos, ainda espera. Muitos filhos dela sofreram prisões, torturas, mas o Fernando desapareceu no Rio de Janeiro e até hoje não há nenhum sinal dele. E a mãe, tão velhinha, quase 100 anos, mora na mesma casa em Pernambuco, e não concorda em sair de lá, embora a casa tenha muitas escadas que lhe prejudicam a mobilidade, porque ela acha que precisa ficar lá porque, se o filho aparecer, saberá onde ela está. Ela não permite, por exemplo, a mudança o número do seu telefone, porque todas as vezes que ele toca, o coraçãozinho dela palpita, pensando que é o filho. É uma tortura. E assim há centenas de casos de pessoas que continuam com suas feridas abertas, querendo saber onde estão as ossadas. Ora, ao menos uma satisfação é devida. Pior que a morte é o desaparecimento. E não há essa perspectiva de se chegar à verdade. Acho muito duro e injusto.
CC: Muitos são contra, acham que é preciso enterrar o passado. O que dizer a eles?
LE: Os que são contra apurar a verdade e fazer justiça alegam que também os opositores da ditadura cometeram crimes. Só que, nesse caso, eles pagaram: com condenações, processos, prisões, torturas, punições severas pela Lei de Segurança Nacional. Não é verdade que os dois lados tiveram o mesmo tratamento. Só os que cometeram crimes de lesa-humanidade, crimes de tortura, de desaparecimentos forçados, de mortes, em nome do Estado, estão impunes até hoje. Essa verdade que vai chegar por meio dessa comissão, se é que se chegará a alguma, vai ser para quê? Só para a memória? Olha, é preciso que seja mais até para o Brasil concluir sua democratização. Porque, enquanto não se virar essa página, passar aquele período a limpo, a redemocratização ficará incompleta.

O formato da Comissão da Verdade é inadequado, diz a deputada Luiza Erundina. Foto: AP
CC: Uma vez a senhora disse que a ditadura militar caiu de podre e não por uma resistência. Logo não houve uma ruptura com o regime que desse início à democracia…
LE: Hoje, os que patrocinaram a ditadura ainda estão no poder. Ainda são as mesmas forças. É só olhar quem está no Congresso, nas instituições políticas.
CC: Há ainda algum caminho para que seu projeto possa chegar ao plenário?
LE: Ele deveria ter sido distribuído para a Comissão de Justiça e Cidadania, mas a Comissão de Relações Exteriores e Segurança Nacional requereu que a matéria fosse para aquela comissão. Já havia uma clara intenção. Agora vai para decisão da Comissão de Justiça e Cidadania. Não vamos deixar de lutar, não. Se for aprovada na CCJ, vai para o Plenário da Câmara. Se não, morre.
CC: Na sua avaliação, haverá ainda outros mecanismos possíveis para que o Brasil possa realmente conhecer suas verdades?
LE: Acho muito difícil. O tempo passa, os mais diretamente interessados vão morrendo. O ânimo de luta se arrefece, a memória se distancia, as novas gerações não viveram aquilo e no Brasil não há uma cultura de se preservar a memória e de se levar os jovens a conhecerem a história. É só um repetido: “Vamos esquecer, para quê revanche…”.

CC: O que o Brasil dirá à OEA até dezembro, quando vence o prazo para a sentença?

LE: O Brasil tem responsabilidades no plano mundial sobre sua posição a respeito dessas coisas. Integra a OEA e é signatário dos direitos humanos. Fica muito mal politicamente. O que não sabemos é se a Corte se satisfará apenas com essas providências, mas, mesmo que sim, certamente os autores da ação vão querer protestar. A gente continuará lutando porque essa causa é perene. Ela serve para evitar outros crimes como aqueles. Não é uma coisa menor. Não é “revanche” ou “para que isso, se faz tanto tempo”. Não é assim. A tortura no Brasil hoje é uma rotina nas cadeias, nos distritos policiais. A reação ainda é “direitos humanos para bandidos não” porque não se preserva a memória. É preciso mostrar o que aconteceu para conseguirmos preservar a democracia.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Por uma autêntica interpretação da Lei de Anistia

*Publicado em 30 de Setembro de 2011 no Le Monde Diplomatique Brasil 


Para a Comissão da Verdade ter eficácia no cumprimento de seus reais propósitos, é indispensável que a revisão da Lei da Anistia seja aprovada. Assim, espera-se que a comissão ofereça as condições para o Estado promover a Justiça de Transição e concluir o processo de redemocratização do país.

A Câmara dos Deputados aprovou no dia 21 de setembro, em regime de urgência urgentíssima, o Projeto de Lei 7.376/2010 que cria a Comissão Nacional da Verdade, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, com a “finalidade de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período de 1946 a 1988, a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”.

Esse projeto foi encaminhado à Câmara pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em maio de 2010, antecipando-se à Corte Interamericana de Direitos Humanos (OEA), no julgamento do caso da guerrilha do Araguaia, que decidiu por unanimidade pela “incompatibilidade das anistias, relativas a graves violações de direitos humanos, com o direito internacional”, ou seja, a Lei da Anistia, aprovada em 1979, “afetou o dever do Estado de investigar e punir ao impedir que os familiares das vítimas”, naquele caso, “fossem ouvidos” por um juiz.

Diante dessa decisão, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 21 de março de 2011, solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que definisse se o Brasil deve ou não cumprir a decisão da Corte quanto à Lei da Anistia.

Ao julgar a ação proposta pela OAB, que questionava se a lei, aprovada em 1979, de fato anistiou agentes do Estado que cometeram crimes como tortura, assassinatos e desaparecimentos durante o regime militar (1964-1985), o STF decidiu, por sete votos a dois, manter a interpretação atual da Lei 6.683 e impedir que os responsáveis por crimes contra opositores políticos sejam processados, julgados e punidos.

O relator do processo, o então ministro Eros Grau, deu parecer contrário à revisão da Lei da Anistia, sob o argumento de que ela teria sido “amplamente negociada”. Convém lembrar, no entanto, as condições em que tal acordo se deu. Os militares, embora politicamente enfraquecidos, ainda estavam no controle do poder, e a sociedade civil dava os primeiros passos na reconstrução da democracia no país.

Por entender a absoluta necessidade de revisão da Lei da Anistia para que se conheça toda a verdade sobre os crimes da ditadura militar e para que os responsáveis por eles sejam punidos, apresentei o Projeto de Lei 573/2011, que dá interpretação autêntica ao que dispõe a Lei 6.683/1979, no artigo 1º, parágrafo 1º.

O referido projeto está na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, da Câmara dos Deputados, e aguarda a votação do parecer do relator, o deputado Hugo Napoleão (DEM-PI), contrário à aprovação da matéria. Qualquer que seja o resultado da votação, o projeto será apreciado, em seguida, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Casa.

Após muito mais de um ano que o Projeto de Lei 7.376/2010 (que cria a Comissão da Verdade) aguarda a instalação da Comissão Especial que deveria apreciá-lo, o governo se mobilizou para apressar sua votação, sem qualquer possibilidade de alterar a proposta apresentada, o que contrariou a expectativa dos sobreviventes e dos familiares das vítimas da ditadura, que têm sérias restrições ao texto original e querem ser ouvidos a respeito.

Eles reclamam por não terem sido recebidos pela presidente da República, Dilma Rousseff, para apresentar sua avaliação sobre a proposta e se sentem desrespeitados pela ausência do ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardoso; do ministro das Relações Exteriores, Antonio de Aguiar Patriota; e da ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário Nunes, nas duas audiências públicas realizadas pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, nos dias 29 e 30 de junho de 2011, às quais compareceram dezenas de familiares vindos de lugares distantes do país inteiro, com enorme sacrifício.

Embora considerem positiva a iniciativa do governo de criar a Comissão da Verdade, apontam alguns pontos do projeto de lei que exigem que sejam alterados: o longo período a ser investigado (1946-1985); a composição limitada a sete membros; a escolha dos integrantes pela presidente da República, sem ouvir a sociedade nem os familiares das vítimas; o tempo de duração da comissão − apenas dois anos − para realizar um complexo e difícil trabalho de investigação em todo o território nacional; a presença de militares entre seus membros; a falta de autonomia financeira da comissão, que poderá limitar suas iniciativas; e a ausência de expressa manifestação no texto do projeto de lei de que os fatos apurados serão necessária e imediatamente encaminhados ao Poder Judiciário para julgamento e punição dos culpados por crimes de lesa-humanidade, nos termos da legislação vigente.

Essas são as principais críticas à proposta, feitas não só pelos familiares, mas também por especialistas que acompanharam experiências de comissões da verdade em outros países e esperam que as falhas levantadas sejam corrigidas, a fim de garantir, efetivamente, o direito à memória e à verdade histórica, bem como promover justiça, e não apenas “reconciliação nacional”.

Revisão indispensável
Ademais, é indispensável a revisão da Lei da Anistia, sem o que a Comissão da Verdade não poderá atingir seus objetivos, pois não produzirá efeito jurídico prático, isso porque, de acordo com o projeto, deve atender aos dispositivos legais, inclusive a Lei da Anistia, editada ainda no período autoritário e cujo propósito foi permitir uma gradual e controlada abertura do regime político.

O projeto que deu origem a essa lei, de iniciativa do então presidente general João Batista Figueiredo, procurava, de um lado, excluir do alcance da anistia os opositores ao regime que eventualmente tivessem sido condenados por crimes de terrorismo, assalto, sequestro ou atentado a pessoas e, de outro, assegurar que a anistia se estenderia àqueles que praticaram crimes conexos ao crime político, beneficiando, assim, os agentes do Estado que praticaram crimes comuns e todo tipo de tortura contra civis que se opuseram ao regime.

Entende-se, pois, que para a Comissão da Verdade ter eficácia no cumprimento de seus reais propósitos é indispensável que o projeto de lei que propõe a revisão da Lei da Anistia seja aprovado antes ou simultaneamente à aprovação da lei que cria a referida comissão.

A expectativa das vítimas da ditadura militar e dos que lutam pelo fortalecimento e pela consolidação da democracia no Brasil é que a Comissão Nacional da Verdade apure, de fato, as graves violações dos direitos humanos, seus autores e circunstâncias, com especial foco nos casos de desaparecimentos forçados ocorridos durante o regime militar.

Enfim, espera-se que a comissão revele toda a verdade sobre um longo e vergonhoso período de nossa história, ofereça as necessárias condições para que o Estado brasileiro promova a Justiça de Transição e, assim, conclua o processo de redemocratização do país, até hoje inacabado

Luiza Erundina
Deputada Federal pelo PSB/SP